O conceito de risco: evento com potencial danoso, exposição e vulnerabilidade

Parque Ecológico do Rio Tietê – São Paulo, SP (acervo próprio)

Parte III: Exposição

Exposição, como vimos no primeiro artigo desta série, refere-se à presença de pessoas, propriedades, sistemas ou outros elementos em zonas de evento com potencial danoso e, portanto, sujeitas a potenciais perdas. [1]

Embora a exposição esteja diretamente ligada a determinado espaço (ou seja, às “zonas de evento com potencial danoso”), ela também é definida por fatores majoritariamente demográficos e socioeconômicos, tais como crescimento populacional, migração, urbanização e desenvolvimento econômico. [2] 

Assim, esta é uma questão particularmente sensível nas cidades, onde a população tende a ocupar o território de maneira concentrada, frequentemente sem planejamento público, de modo que o risco e propensão aos desastres se torna ainda maior. Um terremoto de larga escala numa região de baixa ocupação, por exemplo, fará menos vítimas do que numa região densamente povoada e edificada.

Além disso, a exposição nos centros urbanos também se agrava no contexto de desigualdades sociais, em que os grupos socioeconomicamente favorecidos tendem a ocupar áreas valorizadas, mais adaptadas e menos vulneráveis, enquanto os grupos marginalizados ocupam áreas de menor segurança, maior exposição e, portanto, maior risco.

Esta pergunta pode cruzar o pensamento de muitos leitores: se podemos utilizar experiências passadas, ferramentas, metodologias, dados e estudos de campo para determinar a segurança de determinada área, por que não simplesmente evitamos áreas propensas a danos e deslocamos comunidades para regiões menos expostas aos eventos com potencial danoso? Há ao menos duas dificuldades para essa solução que, à princípio, parece tão simples. 

Primeiro, é comum que áreas propensas a eventos danosos, como costas litorâneas, encostas vulcânicas e planícies alagadas, possam ser consideradas um atrativo para ocupações humanas, considerando os benefícios econômicos que podem ser extraídos da região. [2] Assim, a exposição não é consequência de uma decisão distraída e inconsequente, mas sim de uma ocupação baseada na necessidade, disponibilidade e oportunidade. 

Segundo, deslocar grupos quando já existe uma ocupação é uma tarefa delicada, lenta e, frequentemente, conflituosa. O gestor público precisa levar em consideração a identidade histórica, cultural e social da comunidade, em grande parte associada ao seu local de origem, bem como as necessidades e capacidades do local de destino – que, por sua vez, pode já estar ocupado por outras comunidades.

Outra questão que requer o olhar atento e cauteloso dos gestores públicos é que a exposição não permanece estática, já que as regiões não são imutáveis. Além disso, ainda que as mudanças no espaço normalmente requerem anos e anos de pequenos passos, a intervenção humana na natureza acelera essas alterações. Um dos fatores que podem agravar (e tendem a agravar) a exposição é a crise climática. O aumento da temperatura global, sentido localmente, não só agrava a frequência de eventos extremos, como secas, enchentes e tempestades, mas também contribui para o aumento do nível do mar, ameaça a biodiversidade e, consequentemente, afeta as atividades socioeconômicas das comunidades. [3]

Quando discutimos evento com potencial danoso, apresentamos algumas das dificuldades de reduzir ou evitar a ocorrência tais eventos, seja porque acontecem em diferentes escalas de intensidade, tempo e espaço, seja porque podem se desdobrar em cascata ou ainda porque frequentemente não podem ser previstos o momento e impacto exatos da ocorrência. Considerando que esses eventos frequentemente escapam do controle do gestor público, é imprescindível desenvolver complementarmente estratégias para reduzir também a exposição.

Sugere-se, primeiramente, para reduzir a exposição, que sejam desenvolvidas políticas de habitação, transporte, construção e ocupação do espaço urbano de modo que seja evitado o estabelecimento de estruturas em áreas altamente propensas a eventos com potencial danoso. No Brasil, as principais áreas de risco são as encostas, sujeitas a deslizamentos de terra, e as margens dos rios, sujeitas a inundações. [4]

Não sendo possível evitar tais ocupações, deve ser realizado um planejamento territorial para que a comunidade possa se estabelecer em determinada área sem estar tão vulnerável aos efeitos dela. Requalificação urbana para tornar as estruturas urbanas mais resilientes aos eventos com potencial danoso deve incluir, entre outras ações:

– Evitar a destruição da vegetação de encostas, promover o plantio de espécies de raízes compridas que ajudem a sustentar o solo, evitar amontoamento de resíduos que podem entupir a saída de água, desenvolver sistemas de drenagem com calhas e canaletas, entre outras medidas para reduzir o deslizamento de encostas.

– Aumentar as áreas verdes para melhorar a permeabilidade do solo, promover a limpeza regular dos bueiros e drenagem urbana, gerir os resíduos sólidos urbanos, desassorear os rios, garantir o tratamento de efluentes, entre outras alternativas que podem reduzir as inundações.

Em suma, havendo evento com potencial danoso, não se fala de risco se não houver exposição das comunidades a tal evento; e, se houver exposição mas a comunidade estiver adaptada a tais ocorrências, o risco se torna menor. Confiram, na próxima semana, o último artigo desta série, em que será discutido o conceito de vulnerabilidade, o terceiro e mais crítico dos elementos que compõem o risco.

[1] United Nations International Strategy for Disaster Reduction (2009). UNISDR Terminology on Disaster Risk Reduction. Conferir: https://www.preventionweb.net/files/7817_UNISDRTerminologyEnglish.pdf 

[2] Prevention Web. Exposure. Conferir: https://www.preventionweb.net/disaster-risk/risk/exposure/ 

[3] Smith, J. B.; Schellnhuber, H. J.; Mirza, M. M. Q. (2001). Vulnerability to Climate Change and Reasons for Concern: A Synthesis. Conferir: https://archive.ipcc.ch/ipccreports/tar/wg2/pdf/wg2TARchap19.pdf 

[4] UNICAMP. Mapeamento de áreas de risco. Conferir: https://www.unicamp.br/fea/ortega/temas530/ricardo.htm#:~:text=%C3%81reas%20de%20risco%20s%C3%A3o%20regi%C3%B5es,devido%20%C3%A0%20pr%C3%B3pria%20a%C3%A7%C3%A3o%20humana