
O prezado leitor certamente já ouviu ou utilizou a palavra resiliência em diversos contextos ou campos de especialização. Casualmente, chamamos de “resilientes” as pessoas que apresentam facilidade de reagir a transformações causadas no seu ambiente, de se ajustar às adversidades da vida ou ainda de resistir à determinada situação que tenha escapado de sua zona de conforto ou conhecimento.
A etimologia da palavra resiliência encontra-se no latim, com a conjugação da partícula “re”, indicando retrocesso, e do verbo “salio”, que significa pular. Resiliência, assim, literalmente significaria o ato de saltar para trás.
A definição de resiliência possui uma longa história no campo da engenharia, geralmente relacionada à noção de equilíbrio ou estabilidade, isto é, à capacidade de um sistema de retornar ao estado anterior à disrupção. Revolucionando esse conceito, em 1973, a publicação do artigo Resilience and stability of ecological systems, de C.S. Holling, marca o início da teoria de resiliência moderna, no contexto da disciplina de ecologia. Holling discute resiliência como a capacidade de um sistema ecológico continuar funcionando e persistir, o que não necessariamente envolve permanecer o mesmo. [1]
Dessa forma, inspirada pelo conceito trazido pela ecologia, a resiliência urbana vai muito além da noção de resistência, flexibilidade ou retorno à condição de origem. O meio urbano resiliente não se limita a retornar ao estado imediatamente anterior a um evento transformador, mas procura também aprimorar seus sistemas e torná-los mais sustentáveis.
Conforme descrito por uma das principais referências globais para o tema, a Estratégia Internacional de Redução de Desastres da ONU (UNSIDR) descreve resiliência como a habilidade de um sistema, comunidade ou sociedade, expostos a um evento danoso, de resistir, absorver, acomodar, adaptar-se, transformar e se recuperar de maneira eficiente e rápida, incluindo a preservação e restauração de suas funções e estruturas básicas essenciais. [2]
De maneira um pouco mais enxuta, mas igualmente relevante, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) considera resiliência como a capacidade das cidades de absorverem, recuperarem-se e se prepararem para futuros choques. [3] Trata-se, portanto, de um conceito que traz, de maneira explícita que o anterior, a fundamentalidade do ato de prevenção.
A ONU HABITAT, por sua vez, refere-se à cidade resiliente como aquela que avalia, planeja e age para se preparar e responder a eventos danosos, esperados ou não, buscando a manutenção da continuidade dos sistemas para proteção da vida das pessoas, para assegurar ganhos promovidos pelo desenvolvimento e para acelerar transformações sustentáveis. [4] Interessante notar aqui dois pontos. Primeiro, as cidades resilientes devem se preparar para quaisquer eventos, sejam eles rotineiros ou não, o que traz uma grande incerteza ao gestor público; futuramente, discutiremos as diferenças entre risco, vulnerabilidade e exposição. Segundo, o objetivo principal da cidade resiliente não é manter as estruturas como um fim em si mesmo, mas garantir que a gestão urbana caminhe para direções cada vez mais sustentáveis, visando a proteção da dignidade humana.
Quando pensamos em uma estrutura complexa, formada por diversas redes e conexões, como é o caso dos meios urbanos, desenvolver resiliência requer um esforço de múltiplas dimensões, com o envolvimento de múltiplos atores. Embora passível de discussões mais profundas, especialmente em diferentes disciplinas, deixamos aqui nossa contribuição e entendimento:
Resiliência urbana é a capacidade dos meios urbanos de, através de medidas preventivas e de gestão urbana adequada, resistir, responder e se recuperar de um evento danoso, previsto ou não, de maneira rápida e eficiente, de modo que seus sistemas básicos possam continuar em funcionamento.
Nas próximas semanas, serão publicados artigos essencialmente conceituais, como é o caso do conceito e classificação de desastres; definição de risco, vulnerabilidade e exposição; e reflexão a respeito de sociedade de risco. Esses artigos servirão de base para discussões mais aprofundadas e complexas, de modo que não deixem de acompanhar nossas atualizações e confiram as referências utilizadas para esta publicação!
[1] Sara Meerow, Joshua Peter Newell e Melissa Stults (2016). Defining urban resilience: A review. Conferir: https://www.researchgate.net/publication/288932192_Defining_urban_resilience_A_review
[2] United Nations International Strategy for Disaster Reduction (2009). UNISDR Terminology on Disaster Risk Reduction. Conferir: https://www.preventionweb.net/files/7817_UNISDRTerminologyEnglish.pdf
[3] Organisation for Economic Co-operation and Development. Resilient Cities. https://www.oecd.org/regional/resilient-cities.htm#:~:text=Resilient%20cities%20are%20cities%20that,cities%20can%20increase%20their%20resilience.
[4] UN HABITAT. Resilience. Conferir: https://unhabitat.org/resilience